A persistência da luta contra o estigma das pessoas que vivem com VIH/SIDA (PVVS)

Desde os primeiros casos, tornados públicos, de pessoas com VIH ou SIDA (como se definia na altura), até aos dias de hoje, um caminho de 30 anos, em Portugal, nos separa. Quando no início as pessoas começaram a ter apoio foi em meio hospitalar com todas as dificuldades inerentes a uma nova infecção, que se tornou uma pandemia mundial. Em Portugal, pouco se sabia da doença e começaram a aparecer as primeiras organizações não governamentais, para apoio e informação nesta nova doença e seus portadores. As reuniões de grupo, eram na sua essência, inicialmente, aprender o que estava a acontecer no nosso corpo, como lidar com a situação, aprender a aceitar a doença e aprender a aceitar que, devido há falta de medicação eficaz a morte era uma certeza. Aceitar a morte sem rancor, para com os que nos rodeiam era essencial para se ter uma tranquilidade, para aceitar o desconhecido (a morte). Quando do aparecimento dos primeiros antiretrovirais, criou-se uma esperança. Muitos foram os que, apesar de tudo, não conseguiram sobreviver, já que os medicamentos não faziam o efeito desejado de parar a multiplicação do VIH, no corpo. Nos finais de 1996, aparecem os novos antiretrovirais com diferentes acções sobre o vírus e na sua entrada nas células do hospedeiro, uso da proteína celular, combinação do RNA do vírus com o DNA das nossas células e um teste que vem revolucionar a percepção do avanço do VIH, no corpo – teste de carga viral, ou seja teste que permite saber qual a quantidade de cópias do VIH, existem dentro das pessoas. Cria-se um novo paradigma, na avaliação da qualidade de vida das PVVS, que é a relação entre o valor da carga viral e o número de CD4 (células mais apetecidas pelo VIH, para entrarem e usarem para se replicar). A adesão terapêutica (toma diária dos antiretrovirais, sem falhas) é mais que divulgada e apelada para que haja uma eficácia no tratamento com estes novos fármacos. Aparecem as primeiras comorbilidades, ou seja, as primeiras alterações no corpo humano provocado pelos efeitos secundários da terapêutica e do próprio VIH: perda de gordura em algumas partes do corpo (face, braços, pernas e nádegas) e aumento em outros locais como nas costas, zona púbica, aumento mamário em mulheres e homens, volume na parte superior das costas, junto à base da cabeça, denominado como “bossa de búfalo”. A pressão exercida sobre as farmacêuticas para melhorarem as terapêuticas, com menos efeitos secundários e comorbilidades, levou ao aparecimento de novos medicamentos que têm tido cada vez mais aceitação e reflectem as reocupações das PVVS: menos comorbilidades e menos efeitos secundários. Hoje em dia assiste-se a tomas de um ou dois comprimidos diários e contraposição com os inicialmente usados, pois a coformulação dos mesmos levou à melhoria e condensação dos produtos activos, que inicialmente eram tomados várias vezes ao dia e em tamanhos grandes, para deglutição e necessitarem por vezes de estarem guardados em locais refrigerados, tomados com refeição ou em jejum. Em 1993 aparece um programa dirigido às pessoas que são usuários de drogas: O Programa Nacional Troca de Seringas. É de salientar que a grande maioria dessas pessoas viviam em situações degradantes, física e psicologicamente e se encontravam, concentradas no Casal Ventoso, na Quinta da Curraleira e outros pequenos sítios espalhados pela zona de Lisboa e pelo resto do País. Este programa, inicia-se com a ida de grupos de pessoas (equipas de rua) junto das comunidades de usuários de droga (UD), estabelecendo contactos para a troca de seringa, desinfecções de algumas feridas superficiais e indiciação de vários casos, mais graves, para meio hospitalar. O sucesso com estas equipas nas trocas de seringas e consequente diminuição de novos casos de infecção pelo VIH, conduz a uma parceria entre o programa de Luta contra a Droga e Toxicodependências, Comissão Nacional de Luta Contra a Sida e a Associação Nacional de Farmácias, permitindo que as farmácias possam participar neste Programa Nacional de Troca de Seringas, através da recolha e fornecimento de seringas novas, a quem a elas se dirigem a solicitar. Nos contactos com esta população o conhecimento das suas necessidades e outras infecções associadas ao consumo de droga, por via endovenosa, levou a aumento de apoios básicos dos materiais usados para consumo, bem como de tratamentos e internamentos para PVVS consumidores de drogas que também se encontravam infectados pelo Vírus da hepatite C e com tuberculose. Estas medidas de tratamento com base numa pandemia entre uma população específica, conduziu a uma diminuição das várias infecções. O estigma que, desde o início, se sentiu para com as PVVS e UD, foi esbatendo ao longo dos anos, mas continua a ser patente e presente, no dia a dia destas pessoas, razão pela qual poucos são os que tornam a sua situação de portadores de VIH e/ou VHC, pública e aparecem de cara descoberta. Muito mudou, mas muito há ainda para mudar, já que o preconceito está associado a conceitos de cariz moral e comportamentos sociais que são muitas vezes contrários “aos padrões socialmente bem aceites”. Hoje com a melhoria dos tratamentos com os antiretrovirais, a qualidade de vida das PVVS é similar ao da população em geral, senão melhor, já que são mais controlados com exames clínicos a cada seis meses e pelos médicos. A qualidade de vida das PVVs e UD melhorou substancialmente desde a implementação dos dois programas: programa de Troca de seringas e Programa Nacional para o VIH, já que deu acesso às diferentes necessidades de cada um dos denominados, grupos-alvo. A aceitação social melhorou, mas ainda existem muitas lacunas de cariz social, que urge implementar nos apoios a estas pessoas, com mais necessidades, por vezes básicas.
Notícia retirada:
https://dependencias.pt/images/files/25%20Positivo.pdf

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